A vida
melhor no futuro
Mariana Cruz
O episódio recente dos seis jovens assassinados por
traficantes a caminho de uma cachoeira, que ainda foram torturados antes de
morrer, é apenas a tragédia da vez entre tantos outros crimes hediondos que
pipocam nos noticiários todos os dias. Tais tristes e vergonhosos
acontecimentos dão a impressão de que, a despeito dos avanços tecnológicos, o
homem continua vivendo sob o signo da barbárie.
Há um século seria difícil imaginar o celular, a
internet, a ida do homem à lua, o transplante de coração, mas esse homicídio
sêxtuplo, apesar de provavelmente também ser visto naquela época como uma
atrocidade, não seria algo inimaginável. Parece que a brutalidade do homem é
atemporal, a capacidade da fazer mal ao seu semelhante e a si mesmo não
enfraqueceu com o tempo. Uma matança semelhante a esta poderia ter acontecido
tanto há uma semana, quanto mil anos atrás. Só mudariam as armas. O mesmo
pode-se dizer dos crimes de pedofilia, torturas, agressões verbais e físicas,
roubos, sequestros. Sempre existiram.
A despeito dessas manchas na história do homem, mesmo
no que diz respeito à convivência social, a humanidade parece, de forma
confusa, estar em busca de um mundo melhor. Trata-se, contudo, de uma caminhada
não linear, como uma espiral em que os fatos parecem se repetir, mas é só
aparência, pois o desdobramento se dá de forma diferente.
Exemplos não faltam: se na Grécia Antiga o
homossexualismo masculino era aceito, como pode, milhares de anos depois, não
ser mais? Houve regressão? Não parece ser assim. O homossexualismo masculino
era aceito com diversas ressalvas e, além disso, a maioria das mulheres não
tinha participação ativa na vida política. Assim, questões relacionadas aos
gêneros ainda apresentavam muitas deficiências. Nos dias atuais vemos uma
grande modificação em relação aos direitos das mulheres e sua crescente
participação em diversos setores antes vetados a elas na sociedade. Da mesma
forma que a luta atual contra o preconceito em relação aos homossexuais está
chegando a um lugar nunca antes alcançado com diversos direitos sendo
conquistados, como casamento e adoção de filhos entre casais do mesmo sexo,
entre outros.
Mudanças também são vistas em relação às questões
raciais. Afinal, há pouco mais de cinquenta anos no sul dos Estados Unidos
diversos espaços públicos eram segregados: brancos e negros não se misturavam.
Hoje, tal prática seria considerada um crime.
Há algumas décadas, as mulheres eram vistas como
propriedade de seus maridos, podendo eles inclusive agredi-las fisicamente, a
ponto de Nelson Rodrigues afirmar provocativamente que “toda mulher deve
apanhar, você pode não saber por que esta batendo, mas ela sabe por que está
apanhando”. Hoje em dia, mesmo que isso continue acontecendo nos quatro cantos
do planeta, aqui no Brasil, com a Lei Maria da Penha, o agressor responde
criminalmente pelos seus atos. Ou seja, se antes havia uma condenação informal
de tal atitude por parte da sociedade, ela era velada; afinal, dizia-se que “em
briga de marido e mulher não se mete a colher”. Hoje essa desculpa não é mais
aceita. A criação de uma lei para algo que antes era assunto privado deixa
claro que houve avanço nesse sentido.
Claro que essa marcha da raça humana por vezes
parece meio trôpega: na contramão dessa emancipação das mulheres, do número
cada vez maior de famílias chefiadas por elas, da participação feminina em
diversos setores da política (elas, que até há pouco tempo – 1932 – não tinham nem direito ao voto no
Brasil), nunca tantas mulheres se colocaram como objeto (ou fruta,
no caso das mulheres-melão, morango, maçã etc.), nunca modificaram tanto o seu
corpo em busca de aceitação pelo sexo oposto. Como se vê, são diversas forças
nesse jogo; como lidar com tantas contradições?
Em relação ao mundo virtual, diversas formas
autoritárias de poder passam a ser contestadas, gerando protestos nas ruas, twittaços,
abaixo-assinados. O que dizer das publicações da WikiLeaks, com documentos,
fotos e informações confidenciais, vazadas de governos e empresas? Ao divulgar
crimes de guerra e violação dos direitos humanos, o site presta um favor
à humanidade. Mas, como toda luta contra a corrupção, tem de enfrentar a fúria
dos adversários; seu fundador, Julian Assenge, vem sendo perseguido pelos
países denunciados que buscam a todo custo condená-lo. Isso, porém, não será
tão fácil de fazer como na época das ditaduras, quando os militantes políticos
dos anos 1960 que eram arrancados de sua casa na calada da noite e,
misteriosamente, “desapareciam”. O mundo está vigiando.
Esses e outros exemplos mostram que, mesmo seguindo
percursos tortuosos, a humanidade caminha em direção a um mundo mais ético.
O que estraga é o homem.
25/09/2012